quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Nos meus filhos bato eu

Ouvi esta expressão há uns anos quando ainda não tinha filhos. Confesso que, na altura, não percebi bem o que queria dizer, sobretudo no contexto em que a ouvi. Tinha sido o meu director a dizê-lo ao relatar uma situação complicada com alguns dos colaboradores que geria. O que ele queria dizer agora compreendo perfeitamente. Mas na altura fiquei a pensar nisso.

Lembro-me desta expressão muitas vezes. E, hoje, ao folhear o Correio da Manhã foi o que me ocorreu ao ver as fotografias do José Carlos Pereira, o actor também conhecido por Zeca. Todos sabemos que o mesmo tem problemas com o alcóol. Ele nunca o escondeu e, aliás, entrou esta semana numa clínica de reabilitação. Outra vez. O seu grande problema é ser uma figura pública, pois nem a sua dependência pode tratá-la em paz. Quantos milhares de pessoas não estão na mesma situação? E quantas pessoas lembrar-se-ão que este mesmo José Carlos Pereira além de actor é estudante de medicina?

Bem sei que este é um assunto que convida à discussão. Pois sobre a conduta dos outros todos temos sempre muito que dizer. Que poderão pensar que ele se pôs a jeito. Que se não quer ser falado, por coisas más, deve ter cuidado com o que faz. E rébéubéu pardais ao ninho. Mas a forma despudorada como a sua vida privada foi exposta deixou-me um bocado desconfortável.

Por um lado, os jovens que estavam com ele. Não terão paizinhos que os ensinem a comportarem-se? Não terão paizinhos que os tenham castigado pelo que fizeram? Ou terão sido esses paizinhos a ver nisto uma oportunidade de negócio? Por outro, os próprios pais do Zeca. Como é que acham que se sentem uns pais com um filho com problemas destes? Não será isso suficientemente penoso? Seria mesmo necessário vir um jornal diário escarafunchar numa ferida destas? Da forma como o fez?

O enfant terrible ou a imagem de enfant terrible que o José Carlos nos passa, neste país, leva a que todos se sintam no direito de opinar. Mas e o lado privado da vida pública? E o lado bom das coisas más? Não se aplica aqui?

Nos meus filhos bato eu, deve ser isso que os pais dele pensam. Pois ponham-se no lugar de quem vive com o Zeca, de quem é familiar do Zeca, amigo e colega. Gostariam de ver uma pessoa que vos é querida, com um grave problema de dependência, mas com todo o potencial para vir a ser uma pessoa de sucesso, esfrangalhada pela opinião pública desta maneira?

O que vai no convento só sabe quem está lá dentro... e não há família nenhuma que não tenha histórias para contar, apenas e só, dentro de quatro paredes...

1 comentário:

  1. pois é, minha querida, mas enquanto nos perdermos a julgar a vida dos outros, escudamo-nos à díficil e complexa análise frontal de nós mesmos e dos nossos recantos sombrios.
    abraço*

    ResponderEliminar

Comente! Prometo responder!