segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Dos pesadelos

Lembro-me de ter tido um pesadelo numa noite de febre alta, em que padecia de sarampo, em casa da minha avó. Durante uns anos adornava uma parede da sala um tapete em que a figura central era um tigre. No meu pesadelo o tigre saltou do tapete e atacou-me. Acordei a chorar. Com a minha avó sentada ao meu lado. E eu, de pijama vermelho, lençóis vermelhos, manta de pelo vermelho, a que usávamos na Noite de Natal quando alguém se disfarçava do velhinho das barbas, e de pano vermelho por cima do candeeiro da mesa de cabeceira, agarrei-me a ela. Com toda a força. Até que voltei ao descanso. No seu regaço.
 
Na noite passada acordei com ele a chorar. Uma primeira ameaça que me despertou os sentidos. Depois, um choro pegado que me fez dar um pulo às escuras pelo quarto. Naqueles breves segundos ocorreu-me tudo. Tinha caído da cama, tinha batido com a cabeça, tinha tido um pesadelo. E na beira do colchão, sentei-me. E ele aninhou-se em mim.
 
Até que o batimento cardíaco do petiz voltasse ao normal, deixei-me ficar deitada a seu lado. E o resto da noite foi de vigília. Tal o aperto no peito pelo grito não contido numa noite que se queria calma. É um sufoco. Ouvi-los chorar assim durante o sono. Não há palavras com nexo. Nem explicações que nos acalmem. Apenas a incerteza sobre o que ele viu. Sentiu. Temeu. E uma impotência enorme por não conseguir adivinhar essas noites de tormenta e roubá-las para a minha cama. Para que se manifestem em mim os seus fantasmas.
 

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