quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Duas mãos cheias de ti

Já te contei tudo sobre como vieste ao mundo. Sobre a dificuldade que tive em engravidar de ti. Sobre o dia em que nasceste. Sobre a descoberta que me trouxeste. Sobre a forma assustadora como estás a crescer. Sobre o que me custa saber e sentir que já não és bebé. Já te disse o quanto te amo. O quanto te quero. O quanto me orgulho de ti. Já te disse tudo isto. E não me canso.
 
Um dia irás perceber estes clichés de mãe. Vais perceber porque te parecem as mães todas iguais. Porque adoram abraçar os filhos, mesmo que estes fiquem envergonhados. Porque insistem nas costas direitas à mesa. No beijo de boa noite. No obrigado, no bom dia e no com licença e desculpe. Por mais que essa insistência vos aborreça.
 
Mas não sei se algum dia conseguirei transmitir-te a verdadeira dimensão daquilo que representas na minha vida.
 
Há, para mim, uma vida antes de ti. E outra, completamente nova e bela, depois de ti. Há histórias para contar que gostas de ouvir. E outras que gostas de registar. E essa tua atenção à nossa história, essa tua atenção ao que somos enquanto família, ao que eu e o pai quisemos construir, faz-nos crer que estamos no bom caminho.
 
Fomos simplesmente abençoados com o teu nascimento. Beijaste-nos o coração no dia em que soubemos que vinhas a caminho. Fizeste-nos tremer de emoção. E de medo. Estaríamos nós à altura de tão grande benção? De tão grande responsabilidade? Mas jamais poderíamos nós adivinhar que contigo viriam tantas outras coisas que nos fazem respirar, diariamente, por ti.
 
Contigo veio uma sensibilidade extrema. Veio um coração de ouro que se emociona quando vê um idoso na rua. Veio uma menina cheia de fé. Que ensinou-me também a ter fé. Veio um monstro da matemática e outro da literatura. Umas mãos de artista que desenham a carvão como nunca vi nesta idade. Veio uma nadadora exímia. Que na primeira aula de natação saltou dois níveis por causa da imensa técnica que tem. Veio um ser humano na sua plenitude com tudo aquilo que desejamos num filho. Uma menina. Uma menina muito bem educada. Respeitadora.
 
Também veio uma irmã mais velha. Às vezes sem paciência para o irmão mais novo. Uma chatinha do pior quando não está satisfeita com alguma coisa. Uma curiosa que pergunta tudo quando estamos a ver o telejornal. Uma bailarina de pé pesado que nos desmancha a casa para construir cenários e palcos e teatros. Uma cantora sem qualquer dom. Uma inventora de palavras em inglês. (Estamos desejosos que acertes com o sotaque. E que deixes de atropelar as letras das músicas que mais gostas.) Uma menina como tantas outras que gosta de ver a Violeta.

Aperta-me o peito pensar que um dia poderás não querer mais os meus abraços. Já que me impedes de dar-te abraços infinitos à porta da escola. Aperta-me o peito pensar que um dia as minhas pernas poderão fraquejar perante a tua necessidade de colo. Aperta-me o peito pensar que um dia a minha cabeça poderá esquecer-se desta vida que me deste. E que venhas a sofrer com isso. E não me digas que connosco será diferente.

És a minha melhor amiga. Mesmo que ainda não dês por isso. És a minha companheira diária. Levantamo-nos e começamos o dia ao mesmo tempo. E tu dás-me sugestões sobre o que tenho em agenda. Pessoal e profissionalmente. E olha que consegues ser muito assertiva.

Se uma mão cheia de coisas boas é algo que todos queremos na nossa vida, imagina como me sinto por hoje completar duas mãos cheias de ti. Do melhor de mim. Há dez anos, o melhor de mim. E desculpa se a mãe se zanga. Desculpa se, por vezes, estou cansada. Desculpa qualquer coisa que ainda não entendes. Mas confia em mim. Tal como faço contigo.

Amo-te.

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