segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Coisas que não sabem sobre mim #3

Adoro fado.
Não percebia quando ouvia o silêncio dos ouvintes adultos. Não percebia quando imploravam ao meu avô para cantar um fadinho. E ele, jogando com o seu charme, primeiro recusava. Depois, arrancava com o "fado das duas filhas". Era assim que o intitulávamos.
 
Batia palmas. Porque via os adultos. Sentia-me feliz porque adorava ouvir o meu avô cantar. Mas não percebia. Não percebia o fado do fado. A importância que tinha para aquela família alentejana, saudosista. A minha família. Tenho estas memórias do tempo em que fado não me dizia nada. E tenho memórias do tempo em que o fado me diz muito.
 
Penso que a grande mudança aconteceu com a Dulce Pontes, no tempo em que o Festival da Canção ainda era um acontecimento. Foi no ano de 1991. Tinha 13 anos. E aquela "Lusitana Paixão" bateu-me cá dentro. Lusitana e paixão. Duas palavras que, para muitos, foi a afirmação de um orgulho adormecido. Para mim, uma descoberta.
 
Dizia-me o meu pai que aquilo era fado. Ele, um amante de fado. E se ele dizia, então era verdade. Para mim a Dulce trouxe-me um fado diferente daquele que eu conhecia. Não tão dramático. Mas com muito sentimento. Despertei para a alma lusitana. Para uma paixão que me impulsionou a descobrir mais. Mais letras, mais fadistas. E olhei para a Amália. Uma Amália que não me conquistou. Com uma voz toldada pela vida. Mas gostei das letras que cantava. Aprendi tudo o que consegui aprender. Pela mão da Dulce que com o CD "Caminhos" ensinou-me muitos fados cantados pelos maiores. "O infante" de Fernando Pessoa, "Fado português", de José Régio, "Gaivota", de Alexandre O'Neill, "Filho azul", de Ary dos Santos, "A ilha do meu fado", de João Mendonça. Fados com letras lindas, bem escritas. Uma referência para quem quer saber mais.
 
Aprendi as letras. Cantava-as e ficava cheia de mim quando o meu pai ou o meu avô cantavam um fadinho e eu sabia a letra. E sabia quem a tinha escrito.
 
Quis o destino que já em adulta tivesse que organizar uma exposição a propósito do 10º aniversário do falecimento da Amália Rodrigues. Por onde é que vou começar? Pensei. Por visitar a casa dela. E foi o melhor que fiz. Um destes dias escreverei sobre essa experiência. Mas digo-vos, quem não compreende Amália, porque dela tem a mesma memória que eu, dos seus últimos anos de artista, visite a sua casa-museu.
 
Adoro fado.
Aprendi-o. Apreendi-o. E passo-o aos meus filhos. Sem eles saberem.
Um destes dias vou mostrar-lhes este vídeo.

 

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