segunda-feira, 21 de setembro de 2015

A morte faz parte da vida

A morte figura na história da Ti' Miséria como uma personagem a quem um dia lhe passaram uma rasteira. Ficou presa no cimo de uma árvore e, por isso, não conseguia cumprir o seu destino. Nem o dos outros. Ninguém morria. Nem os soldados enfermos em guerra, nem os animais para pôr no prato. Nem os legumes permitiam-se ser arrancados da terra. A terra que nos alimenta. A terra que nos consome.

Por esta história, pela rasteira que fez a Ti' Miséria, repito vezes sem conta que a morte faz parte da vida. Não que seja uma forma de me conformar com o desaparecimento de quem me é querido. Um escudo. Ou um subterfúgio. Não! É exactamente isso que penso, sinto e tento transmitir a quem não consegue encará-la.

Pois a morte, restitui o equilíbrio do universo. 
É uma passagem para quem parte. Um reset para quem fica. Para quem consegue fazê-lo.
É um momento de dor. Pura e simplesmente de dor. Um assunto tabu. Difícil de explicar. Difícil de abordar. Porque somos humanos. Porque sentimos não a morte, mas a ausência de alguém. Porque fomos ensinados assim. Porque ninguém se atreve a falar do assunto.

E a morte vai vivendo por aí. Por vezes anuncia-se. Por vezes surpreende-nos. Outras ainda, parece que brinca connosco. E os vivos, que não a temem, mas não a querem, pensam nela. Vivem a morte dos outros. E cruzes credo, vamos mudar de assunto. Evitando inquietá-la.

Foi no sábado que morreu um amigo.
Com 29 anos. Vítima de doença prolongada. 

Foi no sábado que nos juntámos para a despedida. Os que o amavam. Os que o respeitavam. Os que lhe reconheciam mérito. Os que tinham por ele consideração. Os que com ele viveram. Os que por ele davam a vida.

Foi no sábado. 
Depois de uma luta desgastante, foi no sábado que ele descansou. 
Perante o anúncio que ela nos fez. 

Perante a morte, somos tão pequeninos.
Encolhemos. Perdemos a voz. Turvam-se-nos os olhos.
Quedam-se-nos os passos.

Perante a morte, enterramos o que nos consumiu em vida. Revemos prioridades. Relativizamos o que nos desgasta. Relembramos as coisas boas dos que partem. Os momentos bons que partilhámos.

Perante a morte, damos mais valor à vida. E às pessoas. E aos momentos. 
E aos pequenos privilégios com que somos brindado todos os dias. 

Perante a morte, choramos. 
E celebramos. Mesmo sem pensarmos ou darmos voz a esse sentimento. 

Perante a morte, também me zango. 
E depois... depois tento compreender o que nos quis dizer. 

Até sempre Ricardo Júlio. Descansa em paz. 
Descansa certo de que o teu percurso entre nós não deixa mágoas.

(O Pedro perguntou por ti. Como sempre. E eu disse-lhe que foste para ao pé de Jesus. 
Ele compreendeu.)

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