Quando era miúda vivi o Natal à moda do Alentejo (pelo menos do Alentejo de onde é a minha família). Casas cheias de gente, cheiro a açúcar e canela, bacalhau cozido e couves, cantares alentejanos, brincadeiras com as minhas primas, peças de teatro, danças, o meu avô cantava sempre uns fadinhos (cantou durante muitos anos num grupo coral alentejano), doces, pinhonate (um doce típico da nossa terra), presentes e, claro, o Pai Natal! Ele mesmo, em carne e osso, com barbas brancas, casaco vermelho de pêlo, com um saco enorme de presentes.
Durantes anos foi assim. A determinada altura da noite íamos para um quarto que a minha avó paterna tinha (foi sempre em casa dos meus avós paternos que passei o Natal, até casar). Deitávamo-nos numa cama de casal, de ferro, enorme aos nossos olhos, e fazíamos de conta que dormíamos. Aqueles minutos eram, apenas, uma desculpa para o Pai Natal conseguir arranjar-se, pôr as prendas no saco, colar o algodão na cara e caracterizar-se sem nós darmos conta.
A minha avó morava num rés-do-chão. Anos houve em que o Pai Natal saltava pela janela para depois tocar à campaínha. Mas, com o passar dos anos, começou a sair pela porta da rua... A campaínha da casa da minha avó era estridente. Um trrrrrriiimmmm daqueles. E quando tocava naquela noite... era a loucura...
Durante anos acreditei. Depois, duvidei. Depois, tive a certeza.
Acreditei que era ele, o Pai Natal. Nunca questionei como é que conseguia fazê-lo numa única noite, à mesma hora, em todas as casas. Nunca questionei como conseguia transportar tantos presentes nem questionei os presentes que me dava. Era tão espectacular aquele senhor que um dia até me deu um computador.
Duvidei, quando me apercebi que o Pai Natal, às vezes, baralhava-se um bocadinho... Distribuía os presentes de acordo com os nomes dos destinatários. Depois quando eram abertos, afinal estavam trocados (a minha avó usava os mesmos papéis de embrulho de ano para ano e nunca riscava os nomes antigos).
Tive a certeza quando descobri os sapatos do meu tio, e as mãos, e a barba mal posta, com bocados de fita cola. Mas alimentei a ideia enquanto as minhas primas e a minha irmã acreditaram (eramos 7 e eu a 3ª mais velha).
Hoje, tenho outra missão.
A de deixar os meus filhos sonhar com esse senhor enigmático, simpático, gorducho, mais parecido com um personagem da Disney que dá o ar de sua graça uma vez por ano. E, até agora, não tem sido difícil manter as coisas como são (nestas idades).
Mas ela, qua vai à missa e ouve o padre dizer que o Pai Natal não existe, que os presentes são oferecidos pelos familiares em honra do nascimento do menino Jesus, se tem dúvidas, são muito íntimas e ainda não está preparada para aceitar a verdade.
Diz-me que o padre quer é que os meninos vão à missa na noite de Natal. Que para ele o Pai Natal não existe, porque ele próprio não tem filhos...
Sei que vai descobri-lo por si. E estou à espera, a qualquer momento, que isso aconteça.
No Domingo, no Museu da Carris, lá estava o Pai Natal sentado num cadeirão, ao lado de uma lareira artificial, decorada a preceito.
Ontem, ela disse-me assim:
- Sabes mãe, acho que no Domingo não era o Pai Natal que lá estava!
(Pensei que tinha chegado a hora...)
- Então?
- Ele era muito bonito e novo. Parecia uma senhora.
(Comecei a preparar-me...)
- Pois, mas o Pai Natal é muito bonito. Tem os olhos azuis e as barbas.... (interrompeu-me)
- Mãe, escusas de fingir!
(Pronto, já está! - pensei eu)
- Eu sei que o Pai Natal existe! Mas como não consegue estar em todo o lado ao mesmo tempo e ainda tem muitos presentes para fazer puseram uma senhora mascarada.
Afinal, ainda não era desta. E disse-lhe:
- Pois é... deve ter sido por isso...
Cruzei o olhar com o pai e a coisa ficou por ali.
Por isso, por enquanto, o Pai Natal continua a existir!
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